quarta-feira, 31 de outubro de 2012

Homenagem a Carlos Drummond de Andrade

Há 110 nascia o grande poeta brasileiro Carlos Drummond de Andrade. Muito mais do que saudade e nostalgia, o dia 31 de outubro deve ser lembrado e reverenciado pela vasta obra do autor, marcada pelos vários caminhos que a poesia moderna nacional tomou.

Esse grande artista nascido em Itabira, no Estado de Minas Gerais, deixou uma obra com grande diversidade de temas, frases e poemas célebres. “Tenho apenas duas mãos e o sentimento do mundo” e “Ser feliz sem motivo é a mais autêntica forma de felicidade” são apenas algumas das máximas do autor.

Sua poesia e o “ser poeta” era a redenção de Drummond, sua consolação, sua cachaça, como ele mesmo escreveu em “Explicação”, do seu primeiro livro, Alguma Poesia (1930).

Carlos Drummond faleceu em 17 de agosto de 1987 aos 84 anos no Rio de Janeiro, cidade onde fica a famosa estátua do autor. É com “Explicação” que o Clube do Alambique faz sua homenagem ao grande poeta que nos embriaga com seus versos.

Explicação


Meu verso é minha consolação.
Meu verso é minha cachaça. Todo mundo tem sua, cachaça.
Para beber, copo de cristal, canequinha de folha-de-flandres,
folha de taioba, pouco importa: tudo serve.

Para louvar a Deus como para aliviar o peito, 
queixar o desprezo da morena, cantar minha vida e trabalhos
é que faço meu verso. E meu verso me agrada.

Meu verso me agrada sempre... 
Ele às vezes tem o ar sem-vergonha de quem vai dar uma cambalhota
mas não é para o público, é para mim mesmo essa cambalhota.
Eu bem me entendo.
Não sou alegre. Sou até muito triste.
A culpa é da sombra das bananeiras de meu pais, esta sombra mole, preguiçosa.
Há dias em que ando na rua de olhos baixos 
para que ninguém desconfie, ninguém perceba 
que passei a noite inteira chorando. 
Estou no cinema vendo fita de Hoot Gibson, 
de repente ouço a voz de uma viola... 
saio desanimado. 
Ah, ser filho de fazendeiro! 
A beira do São Francisco, do Paraíba ou de qualquer córrcgo vagabundo, 
é sempre a mesma sen-si-bi-li-da-de. 
E a gente viajando na pátria sente saudades da pátria. 
Aquela casa de nove andares comerciais 
é muito interessante. 
A casa colonial da fazenda também era... 
No elevador penso na roça, 
na roça penso no elevador. 


Quem me fez assim foi minha gente e minha terra
e eu gosto bem de ter nascido com essa tara. 
Para mim, de todas as burrices a maior é suspirar pela Europa. 
A Europa é uma cidade muito velha onde só fazem caso de dinheiro 
e tem umas atrizes de pernas adjetivas que passam a perna na gente. 
O francês, o italiano, o judeu falam uma língua de farrapos. 
Aqui ao menos a gente sabe que tudo é uma canalha só, 
lê o seu jornal, mete a língua no governo, 
queixa-se da vida (a vida está tão cara) 
e no fim dá certo. 


Se meu verso não deu certo, foi seu ouvido que entortou.
Eu não disse ao senhor que não sou senão poeta?

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